Por Waldyr Ceciliano, médico e CEO da True Auditoria
A conta chegou. Como esperado, os reflexos dos últimos três conturbados anos começaram a afetar as operadoras de saúde em todo o Brasil. Sobrecarga durante a pandemia da Covid-19, demanda represada, alta taxa de sinistralidade, aumento nos custos e dificuldade de repasse no valor de mensalidades são alguns dos motivos que levaram as operadoras a fechar 2022 no vermelho. Sair da crise não será tarefa fácil, mas, para toda doença há um remédio. Otimização de recursos e programas de fiscalização e mitigação de riscos, como o compliance, podem ser a profilaxia que o setor necessita.
Em 2022, houve um prejuízo operacional de R$ 11,5 bilhões no setor de saúde suplementar, o pior resultado desde o começo da série histórica em 2001. De acordo com a FenaSaúde, as receitas dos planos de saúde cresceram 5,6% entre 2021 e 2022, enquanto as despesas aumentaram 11,1%. A taxa de sinistralidade chegou a bater 89%.
Além desses fatores, o setor vem lutando ainda contra um aumento exponencial no número de reembolsos fraudulentos. No final de 2022, a federação apresentou ao Ministério Público de São Paulo uma notícia-crime sobre uma rede de empresas de fachada criada com o intuito de lucrar com pedidos de reembolsos falsificados. Quando somados, os prejuízos chegam a R$ 40 milhões.
Embora os desafios hercúleos, é possível dar a volta por cima e sair da crise sem onerar de forma demasiada o consumidor final. Com medidas simples, porém focadas na gestão sustentável, as operadoras podem assegurar o atendimento com qualidade e trabalhar na retomada dos lucros. O sistema de saúde suplementar no Brasil é grande e tem suas particularidades, porém, o ponto de atenção principal é a gestão clínica e a utilização estratégica de dados e insights. No mundo corporativo atual é impossível alcançar o êxito sem conhecer a fundo os dados da empresa, de seus fornecedores e beneficiários. Dados são considerados hoje a moeda com maior valor de mercado.
A gestão inteligente de recursos é outra ação protagonista nesse momento. As operadoras devem reduzir custos de forma responsável, ou seja, sem comprometer seu serviço. A contratação de empresas especializadas para o desenvolvimento de operações técnicas e administrativas pode ser uma solução importante nesse quesito.
Destaco aqui cinco estratégias para melhorar a gestão clínica em operadoras de saúde:
1 – Adoção de BPO
A prática do BPO – Business Process Outsourcing é um recurso que habilita o crescimento da operadora. É bastante indicado em processos administrativos e também no canal de denúncias. Além da empresa contratante ficar livre para exercer seu trabalho de atendimento da melhor forma, esse modelo favorece também à saúde financeira da companhia, uma vez que as plataformas de gestão, as licenças de softwares, o espaço físico de trabalho, entre outros custos, é de responsabilidade de quem está executando o programa de BPO.
2 – Otimização da auditoria externa
A auditoria, de todos os tipos, é um processo indispensável para instituições de saúde. Aqui destaco e dou ênfase à prática externa, onde os médicos auditores realizam mais visitas recorrentes aos leitos de internação. Um novo modelo também vem ganhando espaço no mercado por tratar exclusivamente de internações consideradas graves, a auditoria intensivista.
Sabemos que os leitos de UTIs e CTIs são destinados a casos graves e, por isso, possuem alto custo para as operadoras. A gestão desses leitos deve ser feita de forma séria e, se possível, acompanhada de perto. A auditoria intensiva é realizada por um médico intensivista que visita pacientes internados em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) e acompanha a evolução de cada quadro. Esse profissional tem acesso a exames, prontuários, equipe médica responsável, pacientes e familiares. Dessa forma, ele consegue avaliar se a conduta dada pelo hospital está de acordo com os padrões exigidos pela ANS.
Esse método tem trazido bons resultados para as operadoras, além de mais conforto ao paciente.
3 – Compliance
Como já citado anteriormente, os dados são insumos indispensáveis para a gestão de qualquer empresa, especialmente as de saúde. É o compliance que deve prever, avaliar e mitigar riscos através da análise minuciosa de padrões. Esse é também o núcleo que vai ajudar a operadora a identificar eventuais fraudes e desvios de conduta, podendo evitar gastos demasiados e, principalmente, crises reputacionais.
Programas de compliance na saúde são recursos que precisam ser cada vez mais usados para a prevenção e mitigação de riscos no setor, aliás, a Resolução Normativa nº 518 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) passou a exigir práticas mínimas de de governança corporativa desde janeiro deste ano.
4 – Investimento em tecnologia
Outra aliada da boa gestão é a tecnologia. Inteligência artificial, telemedicina, BigData, automação, cirurgia robótica e tantas outras inovações estão à disposição do gestor para aprimorar o desempenho da empresa. Aqui vale ainda um adendo: proteção de dados. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) é extremamente rigorosa com dados sensíveis, que são as informações ligadas à saúde. As multas por descumprimento ou infração à lei podem chegar a R$ 50 milhões. Um ecossistema de segurança da informação é indispensável.
5 – Atenção primária à saúde
Aqui temos o assunto que deverá pautar a saúde suplementar do futuro: atenção primária à saúde, que já existe no SUS, mas precisa ganhar mais força no sistema supletivo. O acompanhamento de rotina aos pacientes é uma prática simples, porém muito eficiente, contribui para a saúde do beneficiário e para o controle de custos da operadora, uma vez que na consulta de rotina o profissional médico pode identificar previamente doenças e evitar internações e intervenções cirúrgicas de alto risco e custo.
O velho ditado continua valendo: melhor prevenir, do que remediar.